Kant? Qual Kant? Uma perspetiva sobre a doutrina do esquematismo (Prof. João Alberto Pinto)

01-03-2013

Kant? Qual Kant?
Uma perspetiva sobre a doutrina do esquematismo

1 de março | 13h30 | Sala 208 | FLUP

João Alberto Pinto
Departamento de Filosofia e Instituto de Filosofia
Universidade do Porto

Resumo. Esta leitura de Kant assume opções relativamente drásticas. Eis algumas: a de que uma noção (geral, lógica ou psicológica) de juízo é, bem vistas as coisas, fútil ou ociosa; a de que discutir a natureza (analítica ou sintética, para lembrar os termos envolvidos) dos juízos (teóricos ou, com outra designação, determinantes) é uma maneira, mais ou menos bizantina, de passar o tempo; e a de que é muito excessivo o espaço dedicado às presumidas deduções, designadamente a transcendental, que acompanham os quatro painéis – de juízos, categorias, princípios e, por fim, do nada – das duas edições da Crítica da Razão Pura. De facto, apenas o modo de usar e a concomitante boa ordem dos próprios painéis permanece em aberto. Pelo que nesta leitura de Kant, o que se aproveita em Kant começa por ser a ideia da irrelevância da lógica – entenda-se, da lógica geral – por comparação com a inspiração/revelação/iluminação da matemática e da física – tal como praticadas por Tales (ou outro qualquer em vez dele), Galileu, Torricelli e Stahl, isto nos termos e com as referências usadas no prefácio à segunda edição da Crítica da Razão Pura. (Olhar-se-á também nesta altura para uma folha, a 116v, dos manuscritos de Galileu.) O melhor lugar para perceber as consequências da ideia é a famosa – ou, de outro ponto de vista, infame – doutrina do esquematismo. Infelizmente esta última também começa por ser muito menos uma doutrina e muito mais um problema – ainda por cima obscuro quando se atenta nos exemplos que Kant usou inicialmente ou, de um modo mais substantivo, na atração por exemplos à qual Kant, no momento em que concebia a doutrina do esquematismo, parece não ter conseguido resistir (contra a sua própria melhor, ou pelo menos explícita, opinião acerca de exemplos em geral). De qualquer maneira, o mesmo não sucede quando se leva a sério uma frase (mais ou menos casual, ao que parece) da posterior Crítica do Juízo ou, ainda, o prefácio (pelo menos o prefácio) aos Princípios Metafísicos da Ciência Natural – uma obra com data um pouco anterior à Crítica do Juízo, escrita por alturas da segunda edição da Crítica da Razão Pura, e que é no essencial conhecida (d’après J. Vuillemin) por conter uma reconstrução, dita racional, da mecânica clássica. (Olhar-se-á também nesta altura para uma ilustração que Newton usou.) A partir daqui deve ser claro: (1) o teor da hipótese de uma heterogeneidade radical (e não viciosa) no que é habitual chamar – de um só fôlego, normalmente inspirado por uma ou outra variedade de logicismo – conceito e, com mais um passo, objeto; (2) o lugar que Kant merece numa tradição de pensamento que integra filósofos (antigamente ditos físicos, para ignorar outras designações de má fama, hoje em dia talvez mais correntes) como Demócrito ou A. Sérgio, W. Sellars e G. Bachelard. A pretensão básica da tradição em causa é a seguinte: a imagem vulgar do mundo não é comparável (quanto mais articulável de maneira, digamos, satisfatória) com a imagem científica do mundo – e, se alguma das duas merece a nossa admiração, é a imagem científica do mundo que a merece. (No caso de a cláusula introduzida pelo anterior “se” suscitar algumas reticências, eventualmente por ocultar de maneira um pouco desastrada a comparabilidade primeiro negada, vale a pena notar que também pode fazer parte da pretensão uma certa hipótese auxiliar: a de nada de especial – ou, em bom rigor, de não ilusório – haver para dizer acerca do que merece a nossa admiração. Ela simplesmente caminha lado a lado com eus, com deus e/ou com o universo, precisamente aquilo a propósito do qual parece claro o que Kant disse.) (Project PTDC/FIL-FIL/109882/2009, The Bounds of Judgement – Frege, cognitive agents and human thinkers)

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